30 de ago. de 2009

Hematomas.

Despudorada. Na cama, Raquel sempre amou demais. Estudava de perto as diferentes circunferências, tamanhos, gostos e cheiros. Ela se apaixonava pelo sexo. O resto era resto. Tentou, algumas vezes, sem sucesso, acreditar no amor espiritual. Raquel precisava de carne. Carne nova. Era quase como uma vampira sedenta por sangue. Algo pra afirmar sua imortalidade em meio aos homens. Os antigos desamores só a contaminavam de besteiras. Passou a ocupar o tempo bebendo em butecos. Gastava o que tinha e o que não tinha. Fumava a erva de amigos. Ninguém mais a despertava. Até conhecer João.

João, 24 anos, estudava de manhã e trabalhava a tarde. Tinha os olhos mais bonitos do bairro. Secretamente sonhava ser campeão mundial de ioiô. Gastava seu dinheiro com cachaça e com uma coleção de antiguidades macabra. Carregava no peito um aviso: Não me apaixono.

Trocaram olhares. Foram pra cama. Possivelmente nem lembravam um o nome do outro. No dia seguinte tentaram um beijo salgado com gosto de sono. Cruzaram-se mais algumas vezes. Brindaram outros corpos. Ele se escondia atrás de copos. Passava a imagem de felicidade eterna. Poucas pessoas o viram sério. Raquel, não muito diferente, esporadicamente, lembrava dos olhos de joão. Dos olhos?

Encontraram-se de novo. Um ano depois. Sabiam mais sobre o outro. O decote das costas de Raquel instigara João. Beberam meia duzia de cervejas. Havia no ar uma sintonia orgânica. Os dois corpos estáticos dançavam uma só coreografia. Falaram sobre o preço da maconha, sobre plantações de cebola no centro da Ásia e sobre a vontade de ambos em conhecer Amsterdam. Dessa vez, foram pra casa dele. Inexplicavelmente, Raquel não se preocupou com o tamanho do pau. Ou com a velocidade da transa. Tudo já parecia perfeitamente homogêneo. Ela simplismente gostava de sentir o próprio gosto na boca dele. Os dois pareciam sentir quando era hora de abaixar e levantar as calças. Se despediam com roxos nos braços, pulmões imundos e dúvidas na cabeça.

João tornava-se a paixão que ela tanto entregara fisicamente para outros mil. Juntos, redescobriram o sexo. Era a constante troca que acalmava Raquel.

Eram dois despudorados.

3 comentários:

Julianna Dale Coutinho disse...

muito intenso!

Joaquim Silva disse...

Gosto

Betânia Dutra disse...

sim, é dessa sinceridade que eu gosto, sem arrogâncias, sem auto-afirmações, alice é alice e só, simples. lindo esse texto, mesmo, deu vontade de se apaixonar também, vontade de escrever coisas bonitas e românticas de novo.
adorei, sutil e intenso.
beijos lucinda